Missy Elliot quebra tudo e detona geral

Segunda noite do Back2Black na estação Leopoldina – BACK2BLACK

Nesse segundo dia do festival Back2Black, os orixás gigantescos do artista plástico Carybé que compõe a decoração do espaço, emblematicamente tiveram a sua trilha sonora perfeita. A abertura dos trabalhos com o lendário percussionista brasileiro Naná Vasconcelos foi uma ode ao sincretismo religioso. Com participação especial da bela e carismática cantora Lura (de Cabo Verde), Jorge du Peixe (Nação Zumbi) e do bloco Rio Maracatu, fez aquele palco se transformar categoricamente num belo de um TERREIRO! A batucada comeu solta e de forma azeitada. Quem nunca pisou no dito espaço religioso que acabei de citar, assistindo ao show experimentou essa sensação, só que com um molho bem mais musical nesse batuque. Detalhe interessante eram os 3 pares de gêmeas que faziam parte da banda, tocavam os mesmos instrumentos e estavam vestidas também de forma igual, no mínimo soava inusitado! Belo início, que ao contrário do dia anterior, estava sendo assistido por muita pouca gente… Seria a chuva q insistia em dar o ar de sua graça?

Já simultaneamente no palco alternativo, o rapper mineiro Flávio Renegado, com carreira em meteórica ascensão, despejou a sua mistura azeitada de hip-hop com ritmos africanos, sons eletrônicos, samba e tudo mais o que vier na telha, com muito groove! Como esse espaço é aberto, a garoa caindo com a estrutura meio underground ao redor, me remetia a edição londrina do festival, de como teria sido, já que o próprio Flávio citou a sua apresentação por lá num dos seus discursos com a plateia.

Com certeza, esse é o dia que possui a escalação mais repleta de expectativas por parte de público, pelo ineditismo em “terras brasilis” e importância ímpar dos artistas escolhidos. Na sequência ao show de Naná, mais uma atração com status de lenda, sem ao menos nos deixar respirar. O trompetista sul africano Hugh Masekela, se radicou nos EUA nos anos 60 para fugir do regime segregacionista que dominou durante décadas o seu país. Foi no exílio que ganhou seu primeiro trompete das mãos de nada mais, nada menos Louis Armstrong, com 16 anos de idade. O não menos estelar Dizzy Gillespe foi o responsável pela sua primeira matrícula numa escola de música. Através de sua ex-esposa, a cantora Miriam Makeba, teve o primeiro contato com a música brasileira através do saudoso acordeonista Sivuca, integrante de sua banda e sempre flertou com sonoridades do nosso cancioneiro em sua vitoriosa carreira como músico. Foi comunicado numa ligação inesperada de Nelson Mandela sobre o fim do apartheid em 1990, após 30 anos sem pisar na África do Sul. Já tinha ficado impressionado com sua apresentação na abertura da copa do mundo em seu país, mas o show de ontem, superou qualquer tipo de expectativa. Pra começar a sua incrível vitalidade (do alto dos seus 72 anos!), cantando (e muito!), tocando percussão e tirando aquele maravilhoso e já conhecido som cristalino do seu trompete. Foi uma aula do que podemos chamar de jazz fusion, só que acrescido com forte dose de “latinidade” e “africanidade”, com o improviso comendo solto! Sua versão instrumental de “Mais que Nada” (Jorge Ben Jor), proporcionou o coral do público mais bonito da noite.

Mas independente do material oferecido ser de tão alto nível que poderia causar uma reação contemplativa, a apresentação passou longe da frieza. Com muita simpatia, Masekela fez o povo imitar vocais hilários sugeridos por ele, o que tornou a coisa bastante divertida. Tudo falado anteriormente com relação a figura e importância do cara, foi de forma ímpar, comprovada naquele palco. Sensacional!

No palco Petrobrás, o “hypado” paulistano Emicida, aproveitou seu bom momento e despejou a verborragia agressiva em cima de loops pesados que lhe já é habitual. Vale ressaltar a excelente banda que o acompanha, grande time! Mas era nítida a sua decepção com a reação da galera que não reagia aos seus chamados inflamados e parecia estar mais preocupado com o que viria a seguir no palco principal. Nesse momento o público era umas 10 vezes maior e podemos perceber que os problemas acontecidos no dia anterior, foram fruto de uma superlotação mesmo, pois ontem toda a logística do evento funcionou de forma eficiente.

“Gosto de seus discos (que contêm algumas das melhores canções de todos os tempos para pistas de dança), mas tenho até mais interesse em seu trabalho original de composição, arranjo, produção e também sua filosofia de construção e desconstrução sonora”. O comentário do antropólogo Hermano Vianna, já nos deixa claro a importância da única mulher a estourar na cena machista do hip-hop americano, sem o apelo sexual visual costumeiro ao gênero. Primeira incursão em solo nacional, Missy Elliot, que ficou afastada 7 anos da cena musical por um não divulgado problema de saúde, mostrou a que veio! Com seu indefectível visual de casaco e boné da ADIDAS e a estrutura básica de um show roots de rap (Dj, vocal de apoio, corpo de bailarinos), o show teve a sensação de um belo soco na cara!!! Simplesmente não havia pausas, era só porrada sonora e verborrágica, peso puro!!! Abalou completo e em absoluto as estruturas do local, não deixando ninguém parado, com batidas e vocais que “abduziam” completamente todos os presentes. Concordo com cada palavra proferida pelo Hermano, ela é indiscutivelmente o principal nome do seu segmento e sem apelar pra fórmulas fáceis. Inesquecível, quem não era fã, passou a ser com certeza, era a sensação que percebíamos ao redor. O final inusitado com um truque de ilusionismo que a fez sumir do palco e aparecer com vários tênis (???) que eram autografados e jogados para o público, agitou ainda mais o público que não se cansava de pedir bis! Pelas sucessivas declarações de amor ao Rio, felizmente a teremos breve por aqui. Achei que ninguém explodiria mais aquele palco do que a Lauryn Hill, mas estava redondamente enganado…

O encerramento nos dois palcos, foi com vários grupos de street dance. Por parte de Angola, seu cada vez mais difundido Kuduro e por aqui o tamborzão do funk carioca, com o povo da “dança do passinho”. Aliás, foi um belo embate, quem tinha ficado impressionado com a destreza e habilidade dos bailarinos de Missy Elliot (que eram sensacionais mesmo), percebeu que por aqui e em Angola, não ficamos muito atrás… A galera faz umas coisas inacreditáveis, de só nos imaginando fazendo, já sentirmos alguma dor imediatamente! Segundo dia de Back2Black inesquecível, de lavar a alma, juntamente com a chuva!

Texto: Alessandro Iglesias
Fotos: Gabriela Esteves

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