Festival Back2Black encerra sua edição 2015 com momentos antológicos
No encerramento do Back2Black percebemos que pela primeira vez no festival os dias ficaram mais segmentados. Por exemplo, ontem com exceção do Planet Hemp, os estilos proeminentes foram o reggae e o rap. Esteve claro que a africanidade e as experiências de sonoridade étnica ficariam para o segundo dia. E o início dos trabalhos já nos mostrou isso. No PALCO CIDADE, o projeto Alabê Ketujazz começou emocionando a todos… Diálogos dos atabaques que compõem pontos de Candomblé com o sax virtuoso e jazzístico de Glaucus Linx é uma sacada genial. Simplesmente sensacional! Meia hora acabou sendo pouquíssimo tempo para essa maravilha de abertura COM MUITO AXÉ. E o fundador do grupo é o percussionista francês Antoine Olivier, após ter se tornado “Ogã” em um terreiro no Rio de Janeiro. Incrível!
No PALCO RIO era nítida a expectativa das pessoas por mais um show de Lenine, que sempre se consiste em um acontecimento a parte, pois é uma das figuras mais geniais surgidas nos últimos tempos na música popular brasileira. Mas o buraco foi ainda mais embaixo… Por mais que o maestro Letieres Leite (o “capitão” do projeto) tenha enfatizado que o violão do artista pernambucano vale por uma orquestra, o encontro com a mesma denominada “Orkestra Rumpilezz” foi algo de extraordinário!
A big-band formada por 19 excepcionais músicos baianos, faz um cruzamento maravilhoso de erudito, jazz e ritmos afro. E com o repertório de Lenine (“Relampiano”, “Caribenhã Nação/Tuaregue Nagô”, “Paciência”, “Leão do Norte”) então… Química FENOMENAL resultada dessa experiência de rara beleza. As pessoas riam, choravam, dançavam, olhavam contempladas, a emoção pairou forte no ambiente durante todo o período do show. Um dos momentos mais bonitos e impactantes de toda a história do festival Back2Black. Já teria valido o ingresso até aí! Mas a noite estava apenas começando…
Belo intercâmbio entre as músicas brasileira e angolana (pátrias irmãs, vamos combinar, né?) se resultou no encontro dos jovens Aline Frazão (cantora e compositora radicada em Lisboa), Natasha Llerena (carioca, ex vocalista do grupo Novíssimos) e Toty Sa”Med (guitarrista angolano) no PALCO CIDADE. Foi uma apresentação que revezava entre o intimismo e a explosão, com cancioneiro dos dois países, agradando o público em cheio!
E olha que depois do ocorrido anteriormente com Lenine e companhia, podemos considerar isso um grande feito. O final foi apoteótico com a versão energética de “Canto das Três Raças”, clássico de Clara Nunes, com belo vocal de sotaque lusitano comandado por Aline, e o “ô, ô, ô, ô, ô, ô “ do refrão sendo bradado por TODOS que estavam na Cidade das Artes (que já apresentava ótimo público). Grande apresentação, PONTO!
ENERGIA! É a palavra que pode designar melhor o “furacão” Angelique Kidjo no PALCO RIO. Fez questão de na raçaaaa mostrar quem mandava no pedaço e fazer um antológico show! Seu belo canto e o repertório de africanidade com influências das mais díspares (e acompanhada de excelente banda) nem precisava tanto, já valeria por si só. Mas estava óbvio seu TESÃO em estar naquele palco e com 55 anos mostrou saúde para dar e vender, não parando um minuto sequer.
Foi para a galera cantar no meio da massa e colocou no palco umas 10 meninas para simplesmente participar do show, já que elas ficaram ali até o fim. Teve até momento solo para cada uma mostrar seu “remelexo” no batuque africano. Uma celebração! Os gritos de DIVA ao final não foram em vão, Angelique deu aula de como se fazer um grande show. A Embaixadora da UNICEF e combatente da AIDS no continente africano fez história em nossa cidade!
UFA! Sem nenhum espaço para respirar, a moçambicana Mingas começava sua apresentação no PALCO CIDADE, acompanhada de Wazimbo, Moreira Chonguiça e dançarinas da dança típica Marrabenta. A alma e a cultura do povo moçambiquenho foi mostrada com muita leveza, o que acabou sendo propício, pois nitidamente o público começava a dar sinais de cansaço. Foi nessa hora que me veio a questão da segmentação que citei no início. Poderia ser um reggae nesse momento para dar uma relaxada depois da “explosão Angelique”. E no primeiro dia, senti falta de um pouco de África entre as atrações. Mas enfim, nada que tenha comprometido a belíssima apresentação, com o público reconhecendo com longos e efusivos aplausos. E a dança Marrabenta tem tudo para pegar por aqui, podem anotar!
A tão esperada homenagem aos compositores negros, com direção musical dos mestres Kassin e Liminha (liderando uma banda fenomenal), no PALCO RIO. Como “crooners” Alcione, Mart’nália, Xande de Pilares, Fernanda Abreu, Gabriel Moura e a fadista portuguesa Raquel Tavares. O show será também uma homenagem póstuma ao GRANDE Lincoln Olivetti. Justíssimo! O maestro, músico e arranjador faleceu em 13 de janeiro deste ano, e estava na organização do evento. O início já foi com um dos seus clássicos, “Maria Fumaça”, eternizada pela Banda Black Rio.
E o que esperar de um repertório composto por canções de Arlindo Cruz, Pixinguinha, Buchecha, Luiz Melodia, Carlos Dafé, Johnny Alf, Baden Powel, Paulinho da Viola, Wally Salomão, Jards Macalé, Jorge Benjor, Silas de Oliveira, Martinho da Vila, Cartola, Nei Lopes, Cláudio Zoli e Tim Maia???? Exaltação, clima de festa total, com muita dança na plateia, vários casais se formaram instantaneamente! Na hora que o groove comeu solto, os passinhos se fizeram presente, como nos bailes de charme dos subúrbios cariocas. A energia positiva estava nas alturas, bonito demais de se ver. Belíssimo espetáculo! E o final, com todos cantando a grande parceria de Olivetti com o soulman Robson Jorge, “Aleluia”, ARREPIOU e EMOCIONOU!
Back2Black proporcionando emoções intensas e inesquecíveis para apenas um dia. A diversidade sempre se fez presente na curadoria do evento, mas a escalação de Ludmilla com apenas 18 anos no PALCO CIDADE, com a intenção do funk carioca ter o seu representante, ao meu ver foi equivocada. Ainda mais com TUDO que foi presenciado antes musicalmente. Repertório insosso e de gosto duvidoso, desafinadas ao homenagear Beyoncé, definitivamente não está no nível das outras atrações do festival. Mas parte da audiência aclamou, cantou, dançou… Sim, gostaram. “A voz do povo é a voz de Deus”, não é? Seráaaa?????
Mas uma grande aglomeração nesse momento já se fazia presente em frente ao PALCO RIO. A expectativa em torno do belga filho de ruandeses era imensa. E a palavra que podemos designar para resumir a apresentação de Stromae é IMPACTANTE!!! A abertura com bela produção de luz e imagens foi incrível, não tem como descrever com palavras. O repertório com base em programações eletrônicas e fazendo uma simbiose de eletro-house, hip-hop, música francesa e africana, juntamente com seu carisma incrível, levou a massa que resistiu até o final para vê-lo ir ao DELÍRIO!
Muito simpático, procurou falar em português com o público a todo momento, por mais que o mesmo cantasse suas canções em um francês afiadíssimo, nitidamente impressionando-o. Show incrivelmente sensacional, o Back2Black 2015 não poderia ter terminado de forma melhor. E Stromae é uma gratíssima realidade, ainda vamos ouvir MUITO falar dele. Parabéns aos organizadores por mais uma edição histórica em nossa cidade. Vida longa ao Back2Black!!!
Texto de Alessandro Iglesias
Fotos: divulgação e Milena Calado