IRA mostra que está mais vivo do que nunca
7 anos! Esse é o tempo que o IRA ficou inativo logo após o lançamento do derradeiro álbum “Invisível DJ”. Obviamente, o reencontro foi recebido como um bálsamo de alegria pelos milhares de fãs do grupo paulistano Brasil afora. E os mais jovens também vibraram, já que muitos não tiveram a oportunidade de ver a banda ao vivo. O grande X da questão, é que esse rompimento veio digno das mais célebres tragédias shakespearianas, com tempero adicional do que temos de mais sórdido da dramaturgia que o “anjo pornográfico” Nelson Rodrigues, destilava em sua verve.
Brigas, ódio, traições, conflito familiar tendo seu ápice com o pedido de interdição de Nasi por seu pai, infinitos processos na justiça, combinação cavalar da mistura de álcool e drogas das mais diversas, relatos depreciativos de ambas as partes, biografia explosiva (“A fúria de Nasi”), depressão, FIM! Dois anos atrás, antes do reencontro em formato de “bandeira branca”, de Scandurra e Nasi em outubro de 2013, num show beneficente em São Paulo, fatalmente NENHUM fã apostaria nessa volta da banda, por todas as circunstâncias que foram divulgadas pela mídia em todos esses anos.
Então, o clima além de euforia, é de curiosidade e desconfiança… Essa parada serviu para que cada fundador pudesse trabalhar em projetos particulares com ótimo resultado. Nasi lançou “Vivo na Cena” e “Perigoso”, enquanto Edgard soltou “Amor Incondicional” e “Edgard Scandurra ao vivo”, só coisa “FINA”, mostrando que continuavam afiados após a separação. Mas mesmo assim, como estará o IRA nos palcos depois desse hiato?
Ainda mais que pela primeira vez, a formação da banda que nunca havia sofrido nenhuma baixa em sua história, vem com três novos integrantes. O baixista Gaspa e o baterista André Jung cederam seus postos para Daniel Rocha (baixo), Evaristo Pádua (bateria) e Johnny Boy (teclados).
Mas independente de qualquer coisa, o que o público que esgotou a lotação do Circo Voador queria mesmo, era ter novamente o contato direto com a banda e desfrutar das músicas que marcaram suas vidas. Isso ficou latente nos gritos de “Ira, Ira…” que ecoavam desde cedo pela lona voadora. O VULCÂNICOS fez uma belíssima abertura, com seu som mais calcado na música instrumental. Entraram com bastante energia, e dispostos além de mostrar o seu rock’n’roll da pesada com influência das bandas surf music de garagem dos anos 60, a fazer um ato político pela libertação de um rapaz ainda preso, em virtude dos excessos nas manifestações que tem corrido o país nos últimos tempos.
O vocalista Filipe Proença estava entre os detidos no dia 12 de Julho, e juntamente com outros companheiros de causa, abriu uma faixa no palco com a frase “Liberdade para os presos políticos”. Independente do protesto em questão, a banda cumpriu sem papel no palco com louvor, passando pelo teste de fogo e mostrando que não é mais uma simples promessa.
O IRA com a “Turnê Núcleo Base”, simplesmente mostrou que veio renovado, com mais gás, e a adesão dos novos integrantes contribuiu incrivelmente, dando ao mesmo tempo mais peso e lirismo as canções. Evaristo Pádua, se mostrou mais técnico na bateria que André Jung. Johnny Boy nos teclados, violões, e na guitarra base, preencheu espaços, dando mais alternativas melódicas, e fazendo com que canções que tiveram versões eternizadas pelo excelente “Acústico MTV”, mantivesse parte dos seus arranjos. E o filho “du homi”, Daniel, além de segurar as pontas no baixo, reforçou os backing vocals juntamente com o pai, soando bastante consistente.
A banda fez um passeio por músicas de TODOS os álbuns de sua discografia, incluindo lados B surpreendentes, como “É assim que me querem” (disco “7”), “O bom e velho rock’n’roll” (de “Entre seus Rins”), “Arrastão” (do controverso “Música Calma para Pessoas Nervosas”), o blues arrepiante “Prisão das Ruas”, (do subestimado “Os meninos da Rua Paulo”), a linda “15 Anos” (do clássico “Vivendo e Não Aprendendo”), e o cover de Wander Wildner que cita o Rio de Janeiro, “Bebendo Vinho” (gravada no álbum de versões “Isso é Amor”). Mas foi nos clássicos “Dias de Luta”, Núcleo Base”, “Envelheço na Cidade”, “Flores em Você”, “Rubro Zorro”, “Tarde Vazia”, “Girassol”, “Gritos na Multidão”, entre MUITOS outros, que a casa veio abaixo!!! Faltou “Pobre Paulista”, mas quem se importou???
Aliás, o clima de adoração e veneração se manteve durante aproximadamente as duas horas e meia de espetáculo, com os gritos de IRA após as canções, fazerem nitidamente a banda se emocionar. “Vocês são o melhor público que existe sempre, amamos o Rio de Janeiro e o Circo Voador”, disse um extasiado Nasi. Edgard ainda soltou a pérola da noite: “vocês cantam melhor do que os pais de vocês”, já que a MAIOR parte do público era formada por pessoas que nem sonhavam em nascer quando a banda foi criada em São Paulo, no início dos anos 80.
Foi uma noite para não se esquecer tão cedo, com muito rock’n’roll, emoção, lágrimas, e o exemplo que as adversidades SIM, podem nos fortalecer, e nos fazer evoluir. Mesmo em uma banda consagrada como o IRA, de história irrepreensível no nosso “BRock”, isso foi possível, ficando latente nesse sábado, 09 de Agosto, que COM CERTEZA já está entre os antológicos shows da longeva carreira do grupo. Os MODS (quem não sabe o significado do termo, sugiro pesquisa, valerá a pena) felizmente voltaram, para o bem do rock’n’roll!!!
Texto de Alessandro Iglesias
Fotos de divulgação