‘Luz, Anima, Ação!’ estreia no Anima Mundi resgatando a história da animação brasileira
Na memória da animação brasileira, imagens inesquecíveis conquistaram espaço cativo no imaginário popular, como aquele homenzinho azul tomando vida ao dançar com um cotonete gigante nas mãos ou aquela tartaruga desafiando um motorista de caminhão na busca por uma latinha de cerveja, debaixo do sol escaldante. Estas e muitas outras histórias foram resgatadas e poderão ser assistidas no documentário Luz, Anima, Ação!, que estréia na programação do Anima Mundi 2013, tanto no Rio (entre 2 a 11 de agosto) quanto em São Paulo (de 14 a 18 de agosto). Dirigido por Eduardo Calvet e produzido por Felipe Haurelhuk, o longa-metragem teve co-produção do Canal Brasil, e tem previsão de estreia nos circuitos das salas de cinema para o início de 2014.
Através de entrevistas com personalidades consagradas da área, o filme resgata a fabulosa trajetória da animação brasileira desde o pioneiro O Kaiser (1917), dirigido por Álvaro Marins, até o atual boom produtivo de filmes e seriados voltados ao mercado internacional. Entre os artistas presentes em depoimento estão: Carlos Saldanha (Rio), Mauricio de Sousa (As Aventuras Da Turma da Mônica), Otto Guerra (Wood & Stock), Andres Lieban (Meu Amigãozão) e Marcos Magalhães (criador do Anima Mundi, um dos mais importantes festivais do gênero no mundo).
Não foram esquecidos os imortais filmes produzidos pela publicidade, como as gotinhas da Esso (ainda na década de 1950), o frio que bate à porta das Casas Pernambucanas, o famoso frango da Sadia, o simpático Sujismundo, o realismo da tartaruga e do caranguejo em 3D da Brahma e a beleza de cores da Faber Castell, ao som de Aquarela, entre diversas animações ontológicas que também dão o ar de sua graça.
Também presente está a arte da vanguarda brasileira e de seus artistas, que marcaram essa trajetória com a inovação, a contestação e a experimentação de suas épocas. Destaque para o paulista Roberto Miller e suas animações diretamente na película, que resultaram nos primeiros prêmios internacionais de nosso cinema de animação; e o soteropolitano Chico Liberato, com sua produção regionalista bastante influenciada pelos cordéis.
Os momentos críticos dessa trajetória também são relembrados, como a crise financeira do final de década de 1980 e o projeto neoliberal do governo Collor, que extinguiu a EMBRAFILME e paralisou completamente a produção nacional. Nesse contexto destacam-se verdadeiros guerreiros, como: Walbercy Ribas, que iniciou a produção de O Grilo Feliz justamente nessa época e demorou 17 anos para finalizar o serviço; Mauricio de Sousa, que montou uma verdadeira linha de produção e é o animador que mais arrastou público para os cinemas em nossa história; e Otto Guerra, que mesmo com todas as dificuldades conseguiu finalizar Rock & Hudson no fatídico ano de 1992.
O pioneirismo de diversos artistas é relembrado e, ao mesmo tempo, verdadeiras jóias até então desconhecidas do grande público podem ser revistas em todo o seu esplendor. É o caso de As Aventuras De Virgulino (1939), do cearense Luiz Sá, que acreditava-se estar perdido para sempre. Encontrado em estado avançado de deterioração, o filme foi completamente recuperado em laboratório e pode ser novamente apreciado, bem como outras 16 animações brasileiras de todas as épocas.
Infelizmente não foi possível ter a mesma sorte com O Kaiser. Contudo, a partir de um desenho impresso no jornal, oito animadores criaram suas versões individuais para nosso primeiro filme de animação, cada um com seu método favorito. O resultado é um belíssimo trabalho coletivo que homenageia a obra de Álvaro Marins, e que explora técnicas como o desenho animado 2D e 3D, a animação em massinha, a pintura em película e o arrojado e pouco conhecido método do light-painting. Ao mesmo tempo que criam, os artistas também exibem ao público seu modus operantis.
A animação brasileira está próxima de completar um século de existência, com histórias e personagens tão ricos e estimulantes que sua influência extrapola a seara das artes e invade nosso cotidiano, em um processo rico e contínuo. Boa parte dessa realidade está presente nesse documento único e inédito: Luz, Anima, Ação!, um registro e ao mesmo tempo uma homenagem àqueles heróis esquecidos da cultura nacional que, muitas vezes, chegaram a dar a vida por alguns minutos de trabalho nas telas.
Por Bruno Guedes