Primeiro dia da FESTIVÁLIA foi memorável musicalmente e politicamente na Rio2C

O Rio2C promoveu o inédito encontro dos maiores festivais independentes do Brasil em caráter conjunto! Nos dias 7 e 8 de Abril, no encerramento deste grandioso evento, tivemos toda a multiplicidade cultural que é promulgada nessas pulsações regionais, num verdadeiro ato de resistência, mediante o momento como a cultura independente é tratada no país.

Nesse sábado (07/04), começamos os trabalhos as 15h, com o Festival DoSol, evento que acontece no belíssimo litoral de Natal (RN) e que mandou como representante de sua cena local, uma das bandas mais contundentes da nova geração, o PLUTÃO JÁ FOI PLANETA. O grupo de vigoroso pop-rock, ganhou projeção nacional no extinto programa SUPERSTAR, da Rede Globo. Belíssima apresentação debaixo de muito calor e ainda pouca gente no local. Mostraram todo o seu amadurecimento ao longo dos tempos, que os fez chegar até o Loolapalooza. A sonoridade é bastante envolvente, mesmo para quem não tem familiaridade com o seu repertório. Veio para ficar!

E aí tivemos o privilégio de vislumbrar a apresentação mais impactante que aportou em nossa cidade nos últimos tempos! O “Festival de Inverno de Garanhuns apresenta a nova cena pernambucana” foi uma catarse! Já sabemos que a cena pernambucana é “porreta”, e sempre temos grandes artistas sendo revelados. O Festival de Inverno de Garanhuns tem 28 anos, valorizando todas as expressões possíveis, não só frevo, baião, maracatu, coco e outros ritmos regionais, o buraco é muito mais embaixo… Os nove artistas que fizeram juntos a apresentação (se revezando entre seus repertórios, nos vocais e instrumentos), encheram nossos corações de esperança. Sim, tem MUITA coisa boa sendo construída longe do óbvio mainstream que nos é empurrado goela abaixo.

O repertório incrivelmente escolhido, o vigor e a singularidade de cada figura no palco, em que sempre o jogo era natural e genuíno, fazendo a ideia de coletivo se permear em nossas mentes como se aquilo sempre existisse… Fica realmente difícil destacarmos algo específico com Almério, Isaar, Juliano Holanda, Isadora Melo, Martins, Romero Ferro, Aninha Martins, Amaro Freitas e Flaira Ferro pulsantes a mil, fazendo a coisa ferver literalmente!

Almério já tinha mostrado ao Brasil um pouco do seu incrível carisma e postura cênica no Rock in Rio (juntamente com o conterrâneo Johnny Hooker e Liniker), e realmente o cara impressiona demais. Ney Matogrosso do sertão, foi a alcunha que me permeou imediatamente, e isso não é pouca coisa… As meninas todas são ótimas cantoras, mas especialmente Flaira Ferro impactou com expressão corporal (sua carreira foi construída na dança) bela e explosiva. Seu número solo, em cima de um instrumental do teclado de Amaro Freitas, foi de “cair o queixo”. A direção musical de Juliano Holanda também irrepreensível. Perfeito, mas o final nos proporcionaria mais uma catarse.

Olho no olho com o público, perfilados em silêncio, até que os cartazes com os dizeres “Lula Livre” (o ex presidente nasceu em Garanhuns), e “Mariele Presente” fizeram a energia se condensar em um manifesto político, com a platéia se manifestando em sua maioria com gritos de guerra, outros só observando, resultando num belíssimo momento democrático. A música juntamente com o artista também exerce esse papel, não podemos nos esquecer disso, o Brasil não é apenas o que se massifica através da grande mídia. Show SENSACIONAL, para não sair da memória JAMAIS!

O lendário DJ carioca Wagner Fester agitando o intervalo, contribuindo com um repertório da pesada! Servia também como ajuda para o público se recuperar de todo o ocorrido, mas olha, a noite não estava para brincadeira… A energia dos pernambucanos foi muito bem absorvida pela atração seguinte. Representando o grande Festival Psicodália de Santa Catarina, os “latin-rockers” do FRANCISCO, EL HOMBRE fizeram jus à toda a badalação envolvendo o seu nome e continuaram o incêndio vibracional!

Não é a toa que foram a única banda independente brasileira a ser indicada para o Grammy Latino, na categoria de “Melhor Música em Português”. O molho latino nitidamente veio temperado com os dois irmãos (Sebastián Piracés-Ugarte e Mateo Piracés-Ugarte) mexicanos do grupo, mas a coesão na harmonia vocal é impressionante, belíssimo trabalho!

Vigor e carisma absolutos, o “sangue nos olhos” era de impressionar. E o repertório com letras “mezzo português, mezzo espanhol” vale a pena destacar, pois colocou o povo para bailar (até rimou)! Vamos a difícil tarefa de pontuar  momentos específicos em um show PERFEITO, e ainda mais vindo na sequência do que descrevi antes, mas vamos tentar… Juliana Strassacapa teve uma performance sublime a frente da canção “Triste, louca ou má”, juntamente com um discurso de empoderamento feminino, pela valorização dos direitos humanos, e mais uma homenagem a vereadora assassinada Mariele Franco. Ela já se destacava frente a percussão, pela figura imponente, e por ser a única mulher numa banda onde todos fazem muito bonito!

E a encore, também nos reservou mais um ato político de grandes proporções. Sebastian fez um bonito discurso pela democracia “estremecida” no país pelos últimos acontecimentos, destacou o apoio a Lula e denunciou que o recém escolhido diretor da CBF, já foi preso com uma mala de cocaína em um helicóptero. O povo dos bastidores invadiu o palco com cartazes escritos “Lula Livre”, a pulsante latinidade somada a explosão da banda comendo solta e a audiência em transe! Com palavras de ordem bradadas mais uma vez, fizeram os arredores da Cidade das Artes ficarem com cara de comício! Ufa! FRANCISCO, EL HOMBRE, guardem muito bem esse nome…

O grandioso MIMO FESTIVAL, na batalha desde 2004, e tendo chegado até a Europa em 2016, escolheu um representante que dispensa apresentações, em total sinergia com a sua magnitude:  o rapper EMICIDA! Show afiadíssimo, o último de uma turnê de 184 shows (do disco “Sobre crianças, quadris, pesadelos e lições de casa”, indicado ao Grammy Latino), sucesso de público e crítica, passagem por vários países, e o cara trouxe toda essa emoção para sua peculiar verborragia.

Repertório em total sintonia com o público, era o artista com maior reconhecimento  desde então, e a audiência cantou juntinho TUDO, foi bem bonito! E mandou ver em batidas afro nervosas, referências as suas viagens a África, como relatou, fazendo a Cidade das Artes se transformar em um grande terreiro!

Obviamente utilizou de todo o seu já “mais do que conhecido” carisma para falar sobre as questões políticas atuais, fazendo referência com acontecimentos de sua trajetória, sempre com leveza e bom humor. Declarou amor pelo público do Rio de Janeiro, e juntamente com a poderosa e afiada banda, fez um show memorável. Aliás, mais um, como sempre, né?

Que dia incrível para a música brasileira meus senhores! E pensar que no dia seguinte ainda teria mais…  Festivália, um GOLAÇO da Rio2C!

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