Escritor Oswaldo Veiga faz revelações sobre o livro “Subversões”

Este livro está diretamente ligado à vida dura e repleta de pedras pelo caminho”; Oswaldo Veiga brinda os leitores da CultMagazine com uma entrevista sobre a obra “Subversões”.

Catarse, do dicionário Purificação, purgação, método que consiste em trazer à tona do fundo do próprio inconsciente os estados afetivos mais reprimidos, a fim de libertá-los das consequências ou problemas físicos/mentais, oriundos do recalcamento. No teatro considerado um momento trágico do espetáculo em que se desenvolve uma espécie de libertação, principalmente dos sentimentos mais intensos como pavor, ódio ou paixão, é também o ponto de partida do livro “Subversões” de Oswaldo Veiga, onde o título da obra já indica, que o tema central possui um compromisso com sentimento humano na sua forma mais crua e individualista, o lado obscuro que dá as caras naturalmente em cada um de nós: a revolta, o desejo por destruição, a perversão. De acordo com o próprio autor, a obra é uma leitura das inversões da vida moderna, onde temos uma espécie de versões dos contos de fadas associadas a violência urbana cotidiana. Os temas pesados e considerados por muitos “ultrajantes” como a prostituição, traição, adultério e o uso de drogas, são o grande diferencial do livro, e se encontram já nas primeiras páginas em uma linguagem franca, sem rodeios, sem a menor vontade de oferecer ao leitor “floreios” sobre seus personagens. Aqui se enxerga a vida como ela realmente é, afinal em tempos de Best-Sellers de romances plásticos e impossíveis, e da artificial auto-ajuda, talvez faltasse mesmo um livro para nos confrontar com as injustiças da vida e nos fazer enfrentá-las de cara dura, mesmo que isso acontece através de um ângulo pessimista, “Subversões” é forte, é real.

Confira a entrevista com o escritor Oswaldo Veiga, autor do livro, e entenda como foi o processo de criação, suas inspirações e outras informações sobre o livro, sem spoilers.

Inicialmente, explique um pouco mais sobre a proposta do seu livro “Subversões”.

Subversões” é um livro de contos. Nele está contida uma seleção de contos: curtos, pestilentos, interna e externamente maculados, que abordam diferentes temas, tendo todos um ponto em comum – as subversões. E quando me refiro às subversões, falo como ruína, como perversão moral, como inversão de valores, como perturbação e também como versão menor de algo.

Você é escritor há quanto tempo? Como você se inseriu nesse mundo, ou ele sempre fez parte de você?

Não sei quando comecei a escrever, mas sei que nunca guardei os meus escritos. Lembro-me, certa vez, ainda na terceira série primária, que escrevi um conto sobre um sonho fantástico. O conto tinha umas seis folhas de caderno. A tia Aniese (minha professora) corrigiu… Graças a Deus isso desapareceu – seria triste ler este escrito e me julgar por algo que escrevi tão jovem…

Na primeira faculdade que cursei (Artes Cênicas), tive uma professora que foi convidada para a mesma festa em que eu estava. Muitas cervejas e doses de vodca mais tarde, a pobre não resistiu e um espírito (ou entidade, sabe-se lá), se apossou do corpo da coitada. Após falar muitas coisas para pessoas que pouco queriam ouvir, “a coisa” (vamos chamar assim essa manifestação) olhou nos meus olhos e disse: “você não atua, você escreve!”. Relutei (pois também adoro atuar), mas este fato acabou marcando bastante a minha vida, sobretudo porque esta professora nunca havia me visto atuar nem nunca chegou a ler nenhum texto meu (ela lecionava a disciplina de “Figurinos e Adereços”).

Já escrevi diário, peça de teatro, um romance (que não possuía backup e que um vírus fez o favor de comer), crônicas… só não escrevo poesia. Adoro e admiro aqueles que o fazem bem. Os que não fazem bem me causam certa vergonha, confesso.

Atualmente procuro não me criticar tanto. Não consigo! Mas pelo menos consigo guardar aquilo que escrevo, modificar, melhorar… até que o escrito assuma uma forma que me agrade.

Comecei a escrever os contos de “Subversões” em 2007, sem qualquer tipo de pretensão de publicá-los e hoje sinto essa necessidade como o fechamento de um ciclo… acho importante fazer a publicação e deixar que os contos possam “ficar em paz” (ou, caso contrário, acabarei modificando-os cada vez que abrir o arquivo).

Mais do que “ser escritor”, acho que sempre gostei de “criar histórias”. Sou uma pessoa que “gosta de ser muitos”. Alguns chamam isso de esquizofrenia: neste caso, chamo de Arte. A Arte nos possibilita tudo. Quando escrevo tenho a chance de ser Deus, tenho a possibilidade de ser imortal, posso ser o capeta dos meus próprios personagens e o demônio de mim mesmo.

Entre suas obras favoritas, está em peso Nelson Rodrigues, que retratava sem rodeios e purismos, o lado muitas vezes hipócrita e sórdido da sociedade. Ele serviu de inspiração para o nascimento de “Subversões”? 

Há outros escritores e livros, que também foram inspirações?

Sim. Não vejo a figura de Nelson Rodrigues unicamente como um escritor. Acho que ele representa, antes de tudo, uma força estética. Sou apaixonado pela obra desse escritor desde que a conheci (não me lembro quando). Meus trabalhos acadêmicos normalmente se baseiam em suas obras. Atualmente cursei uma especialização em Literatura Brasileira, na UERJ, e minha monografia foi baseada em suas memórias “A menina sem estrela”. Uma obra prima, assim como toda sua obra ficcional. Antes disso fiz outra especialização – em Literaturas de Língua Portuguesa – e nela me utilizei da peça “Álbum de Família” para a elaboração do meu trabalho. Portanto, respondendo à pergunta, sim, Nelson Rodrigues serviu e serve de inspiração para a criação de “Subversões”. Suas abjeções são singulares. O teatrólogo leva as subversões humanas a um patamar quase inimaginável.

De certa forma, tudo o que já li acaba influenciando na minha criação literária. No caso de “Subversões”, poderia destacar, além de Nelson Rodrigues, escritores como o teatrólogo norte-americano Eugene O’Neil (e seus personagens tão densos e complicados quanto os de Nelson Rodrigues), o escritor português José Saramago (que foi odiado por muitos cristãos graças a sua literatura visceral e não menos subversiva), Carlos Drummond de Andrade (e o seu sentimento de mundo)… e a simplicidade da escrita de Luís Fernando Veríssimo, que tem a capacidade de transformar o corriqueiro em obra-prima.

As histórias que são narradas em cada conto apesar de tratarem de questões comuns do ponto de vista emocional ou físico, foram baseadas em experiências pessoais? Há uma união do fictício e pessoal?

Sempre há uma união entre o “ficcional” e o “real” e estará mentindo aquele que disser o contrário. Nós somos capazes de ficcionalizar aquilo que vivemos, ou aquilo que vimos o outro viver, ou ainda aquilo que nos foi contado. Pegamos histórias pelas quais temos certo carinho/interesse e damos a ela uma nova roupagem. Por isso também o nome “Subversões”, como versões menores (seja em relação ao tamanho ou ao valor literário – não importa). Se em alguns contos existe a ficcionalização de experiências vividas por mim? Sim. Nem sempre, mas sim. Acho que mais do que isso, poderia dizer que cada conto representa um Oswaldo Veiga diferente, um medo diferente, um desejo distinto, um pessimismo em relação a todas as coisas (que prefiro chamar de realismo).

 É fato que muitas das situações construídas em suas histórias refletem cruamente impressões sobre o comportamento humano em geral. Como foi esse processo de descoberta? Como surgiu a ideia de abordar as tais subversões descritas até o momento em que você começou a escrever?

Eu poderia separar o livro em 3 momentos distintos: no primeiro momento Subversões trata de relacionamentos interpessoais; depois a temática torna-se mais densa e o tema central passa a ser a morte – a morte como um ponto final; em um terceiro momento passo a divagar sobre questões míticas, místicas e fantásticas (no sentido de sobrenatural) e novamente pela questão da morte como todos queremos/tentamos/precisamos acreditar, a morte como uma continuação do que foi a vida…

Não sentei e pensei: “hoje vou criar um livro sobre subversões”. Na verdade, parece que o livro foi, aos poucos, se desenhando sozinho. A partir do momento em que percebi que meus contos estavam enveredando para este caminho inevitável pensei “ok” e deixei fluir. Precisei, obviamente, torturar alguns personagens, fazendo com que sofressem antes de seus destinos finais, mas confesso: gostei deste “papel” de sádico. Senti-me como o personagem Fortunato, do conto “A causa secreta” de Machado de Assis.

Gosto muito de pensar a Literatura enquanto catarse. Acredito na purificação da “alma” através da descarga de desordens emocionais. Desta forma podemos nos libertar de tudo aquilo que nos é estranho. Basicamente, se eu fosse exemplificar de forma bastante superficial, diria: é como uma lavagem, em que após muita merda (com a licença da palavra) o indivíduo torna-se mais leve.

Que sensações que você deseja provocar no leitor?

Aqueles que lerem Subversões e depois resolverem, ao me encontrar, dizer: “Nossa! Adorei seu livro… é tão bonito!”, saberei que estão mentindo, tentando agradar (ou que não leram efetivamente a obra). Acho que aqueles que tiverem a oportunidade de ler todos os contos terão, ao fim, uma sensação de angústia, de desespero, de revolta (para comigo). Cada conto, na verdade, tem sua carga emocional própria: acredito, por exemplo, que um cristão ao ler o conto “Gênesis” me odiará… (aliás, das poucas pessoas que já o leram adianto: a única que gostou fui eu).

Acho que a sensação chave será o rebuliço, o incômodo, a cólera… Desejo que o livro e as histórias continuem vivas mesmo após o leitor terminar de ler. Seria desestimulante saber que alguém leu, guardou em sua estante e aquilo não causou absolutamente nada. Acredito que o incomodo consiga preencher este papel muito bem, vide “Ensaio sobre a Cegueira” e “Caim”, do Saramago, por exemplo.

Mas, sinceramente, é muito difícil tecer previsões sobre a recepção. Convido àqueles que forem ler o livro para que, posteriormente, entrem no meu site ou na fan-page do Facebook e enviem suas opiniões.

Há muitas referências musicais contidas no livro, seja para situar os personagens ou para complementar os sentimentos deles possibilitando uma leitura mais aprofundada. 

Porém, não é muito fácil para alguns escritores, construir uma tal “imagem musical”. Quais são primeiramente suas referências musicais pessoais? E como você conseguiu visualizar as canções dentro do contexto das histórias? Elas surgem fruto de uma inspiração quando escreve, ou há algum tipo de pesquisa?

Eu gosto de música. Ouço absolutamente tudo aquilo o que considero bom. Minhas referências musicais pessoais são Black Sabbath (com James Dio nos vocais), Heaven and Hell (uma espécie de continuação do Black Sabbath), tenho ouvido cada vez mais Jethro Tull, sempre gostei do KISS, Megadeth, AC/DC, Alice Cooper, Celso Blues Boy (que infelizmente morreu este ano), Velhas Virgens, Matanza, Skylab… são muitas as bandas e eu poderia citá-las durante um longo tempo… Além do Rock and Roll, sou muito fã da cantora italiana Laura Pausini. Ah, sim: e também gostou muito de “músicas velhas” – aquele tipo de música que, quando estou ouvindo, alguém sempre chega do meu lado e faz o nojento comentário: “Nossa! Minha avó gostava disso!”. Vicente Celestino, Aracy de Almeida, Antônio Marcos, Paulo Sérgio e um monte de outros nomes que poucas pessoas saberão de quem estou falando…

As músicas surgem na minha Literatura com a mesma naturalidade com que surgem, por exemplo, as comidas, as bebidas e o fumo. Se faz/fez parte da minha vida e/ou dos meus gostos, estará ficcionalizados na minha Literatura. É claro que, posteriormente, quando começo a trabalhar o texto, pesquiso profundamente para ver se tudo está de acordo – se concordo, ok, se discordo, busco outra música que possa se encaixar adequadamente. No conto “Heartbreak Motel”, que abre o livro, a personagem Gaby cantava uma música que precisou ser mudada, a fim de melhor se enquadrar no contexto do conto – ela antes (na concepção original), cantava “Por Você”, do Frejat, mas precisou cantar “Cigarro”, do Zeca Baleiro… O próprio título do conto já faz referência à música gravado por Elvis Presley. Penso que quanto mais referências puder dar ao leitor, mais verossímil e mais rica tornarei a minha Literatura. Só consegui escrever o conto “Sala de estar” mantendo o player de MP3 no modo repeat na música “Dorogoi Dlinnoyu”, de Alexander Vertinsky.

Daria para montar uma trilha sonora do livro “Subversões”, com as referências musicais presentes no livro – e uma trilha de qualidade, penso.

Levando em consideração, a dificuldade inicial de muitos escritores no Brasil ao lançar seus primeiros trabalhos, qual o diferencial que você acredita ter suas obras?

Em primeiro lugar, acredito que minhas obras se diferenciarão no que concerne à liberdade artística. Não submeti meu original a nenhuma editora – até porque sabemos que dificilmente alguma publicará um livro de contos ou de poesias (por exemplo), de um desconhecido. Nas Literaturas acontece basicamente o que acontece na Música: parece que todos querem um pouco de mais do mesmo. Parti, então, para a autopublicação, imprimindo sob demanda apenas os livros que eu vender. Infelizmente, com isso, o produto final acaba sendo sensivelmente mais caro do que se eu mandasse imprimir umas mil cópias (coisa que eu não poderia fazer neste momento, já que não poderia custear e não tenho espaço para guardar esta quantidade exorbitante de exemplares). Aposto também na venda dos e-books (livros eletrônicos). Quem não quiser ou não puder pagar pelo exemplar físico do livro poderá optar pelo livro digital, com um custo de um terço apenas do valor do livro.

Mas gosto desta liberdade artística que citei anteriormente: eu busquei a imagem que queria para a capa, eu a trabalhei, eu escolhi a pessoa que eu queria para escrever o prefácio, e por aí vai… O processo foi difícil, cansativo, penoso…? Sim, mas gosto do resultado: está tudo do jeitinho que penso que deveria ser…

Quanto à questão literária, espero corresponder às expectativas de todos aqueles que já estão e que ainda irão adquirir livros ou e-books. O principal, contudo, está feito: a apreciação ou não da obra deixo nas mãos do público leitor.

Já tem outros projetos em vista a serem publicados em um futuro próximo?

Anteriormente a “Subversões” eu escrevi uma peça teatral infanto-juvenil (que mandei imprimir como um livro e que na verdade registrei, mas não publiquei). Por se tratar de uma peça teatral, gostaria que fosse encenada. Talvez um dia a publique – sem compromisso. Além disso, estou trabalhando em um novo livro de contos ainda sem título, mas que seguirá os padrões da peça teatral “La Ronde”, de Arthur Schnitzler. Também tenho o projeto de um romance policial parado há algum tempo. Sou fã do gênero. Também tenho um projeto totalmente pronto sobre um livro infantil, entretanto desenho muito mal. Se alguém que desenha bem quiser fazer uma parceria é só me mandar um e-mail. E se as subversões continuarem atormentando minhas ideias, quem sabe uma continuação? Não tenho nada contra produções seriadas. Enquanto isso seguirei postando esporadicamente em meu blog e traduzindo e legendando algumas músicas no meu canal do YouTube (como hobby).

 Página Oficial: Subversões

Blog do autor: Oswaldo V.

Conta do Youtube: Veiga Metal

Por Juliana L. Farias

One Reply to “Escritor Oswaldo Veiga faz revelações sobre o livro “Subversões””

  1. Como farei para conseguir comprar uma publicação do livro? Estou interessada. Não Sou subversiva, mas gosto muito de viajar num mundo diferente do que vivo. Acho que o que me encanta na literatura é isso, a oportunidade de deixar de ser eu para ser estes personagens corajosos, de dizer ou fazer aquilo que não teria coragem.É isso.

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