Tarantino chega ao seu ápice em Django Livre

Primeira investida direta de Quentin Tarantino ao gênero que homenageou veementemente em quase todos os seus filmes anteriores: o western spaguett. Para quem desconhece o citado rótulo, surgiu com a popularização de uma produção em massa de filmes de “bangue-bangue” italianos, com orçamento modesto somado a pitadas de humor e que foram muito populares nos anos 60 e 70. O próprio nome DJANGO veio de um desses sucessos (o filme homônimo de 1966), estrelado por Franco Nero, que faz uma pequena participação no novo “arroubo tarantinesco”. DJANGO LIVRE passa longe das belas insanidades anteriores do diretor, como a desconstrução dos fatos do nazismo e da segunda guerra (“Bastardos Inglórios”), sua ode a vingança repleta de referências dos filmes “baratos” (western, artes marciais e horror B com erotismo) que passavam nas sessões duplas “grindhouse” (aqui no Brasil chamadas de “poerinhas”) como “Kill Bill” e “A Prova de Morte” e ao estilo “blackspotion” (“Jack Brown”), produções feitas e protagonizadas por negros nos anos 70 (mais um interesse seu por um gênero considerado “menor”). Esse é DISPARADO o filme mais convencional de sua filmografia, podemos dizer que é um western spaguett clássico. E isso é ruim? Não! Nem por isso a transgressão habitual foi deixada de lado, pois afinal de contas é um faroeste sobre a escravidão protagonizado por um negro (Jammie Foxx), com a palavra “nigger” (termo considerado pejorativo e quase um tabu para os americanos) proferida a exaustão durante todo o filme, o que logicamente já causou polêmica. Um dos atores que mais estrelou os filmes do diretor (pra variar em um papel surpreendente neste) veio em sua defesa: “A palavra em si não é uma violência maior do que as outras que se praticavam contra os afro-descendentes. Pode-se mostrar então a brutalidade física e não a oral? Ridículo, isso não faz sentido!”, detona Samuel L. Jackson.

E a marca de Quentin Tarantino dentro dessa suposta “convencionalidade”, mesmo assim se faz presente: a violência gratuita e exacerbada, os longos diálogos nonsense repletos de humor negro (o dos membros da Ku Klus Kan com dificuldade em enxergar por causa do capuz é sensacional) e dentro do seu “liquidificador pop”, a trilha sonora mais eclética possível exercendo um veemente protagonismo na condução dos planos (a canção tema do “Django” original, de Rocky Roberts, esta lá!). E já é de praxe o resultado ímpar conseguido na interpretação do seus dirigidos, com Jammie Foxx, Leonardo di Caprio e o já citado Samuel L. Jackson em desempenhos excepcionais. Só que mais uma vez, Christopher Waltz como coadjuvante de luxo rouba a cena (a exemplo de “Bastardos Inglórios”, que lhe rendeu um Oscar)! E não duvidem se o austríaco de 56 anos conseguir a façanha de uma segunda indicação e um segundo Oscar sucessivamente (as bolsas de postas o apontam como favorito!). Enfim, é puro Tarantino, no auge maior do seu refinamento plástico, com uma ficção sobre escravidão cumprindo papel de denuncia em tons operísticos e numa condução primorosa como um todo. Delicie-se sem medo!

Por Alessandro Iglesias

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