“Até Que a Sorte nos Separe” é o filme mais divertido do ano

Do mesmo diretor de “De Pernas para o Ar”, longa-metragem é puro escracho e faz disso seu maior trunfo

Em um tempo em que a preferência tem sido por produções dramáticas, engajadas ou de humor mais sutil, uma comédia rasgada do calibre de Até Que a Sorte nos Separe vem a calhar no cinema brasileiro. Paulo Cursino (De Pernas para o Ar) desenvolve o roteiro ao melhor estilo Adam Sandler: absurdos e falta de noção em doses cavalares, com o único intuito de fazer rir ao máximo. Missão, diga-se de passagem, muito bem cumprida.

A história – uma espécie de sátira ao livro de auto-ajuda Casais Inteligentes Enriquecem Juntos, de Gustavo Cerbasi – gira em torno de um casal humilde que ascende socialmente ao faturar um prêmio milionário na loteria. A mudança não fica restrita ao lado material: nos dez anos que se seguem, o personal trainer Tino passa do físico atlético de Marcos Pitombo (galã das novelas da Record) ao perfil avantajado do humorista Leandro Hassum – ele é agora um milionário boa-vida e extravagante, que não poupa gastos para satisfazer os caprichos da esposa, a perua Jane (Danielle Winits), e dos filhos Tetê (Júlia Dalavia) e Juninho (Henry Fiuka). Uma versão mais escrachada da família do Tufão (Murilo Benício) de Avenida Brasil, pode-se dizer.

Após tantos anos vivendo sem preocupações, Tino leva um susto ao descobrir que esgotou o último centavo do prêmio da loteria. Ou seja: não apenas está falido, como afundado em dívidas. Sua única salvação é apelar para o vizinho, Amauri (Kiko Mascarenhas), um consultor financeiro metódico e controlado que sempre desdenhou da rotina irresponsável de Tino e sua família. A princípio encarregado de ensinar o ex-milionário a viver apenas da forma mais básica possível, Amauri acaba se tornando seu cúmplice por conta da inesperada gravidez de Jane, que inspira cuidados e a impede de passar por aborrecimentos. A partir daí, os dois vizinhos-desafetos se unem em manobras arriscadas – e divertidíssimas – para esconder da esposa de Tino que está de volta o tempo das vacas magras.

São incontáveis os momentos cômicos deliciosos do longa. A reação de Tino ao descobrir a terceira gravidez de Jane; a tentativa do protagonista de voltar a dar aulas de ginástica apesar da gordura; os comentários de Tino sobre a semelhança de uma boneca com Chucky, o Brinquedo Assassino (quem assistir entenda); ou a participação de Aílton Graça – nunca antes tão cômico – como um dono de bar que se passa por designer homossexual para ajudar Tino a ludibriar Jane. Sem nenhuma preocupação com o politicamente correto (e tampouco com a lógica), o diretor Roberto Santucci ganha o público nas gargalhadas francas e desenfreadas que seu filme provoca.

Até Que a Sorte nos Separe contém, no entanto, algumas falhas importantes que chegam a comprometer um pouco seu desempenho. A carga de exagero passa da conta em algumas sequências, mesmo tendo em conta a proposta do filme – idem para as caras e bocas do talentoso Hassum. A história, ao invés de adotar uma estrutura linear, envereda por uma extensa quantidade de situações pouco interligadas que, a um determinado ponto, chegam a cansar o público. A impressão que se tem é que se está assistindo à maratona de uma sitcom e não a um longa-metragem. [Sensação similar à deixada por filmes como O Bem-Amado (2010), que mais tarde foi transformado em série de TV. Teria a Globo os mesmo planos para a história de Jane e Tino?]

Até Que a Sorte nos Separe poderia ter nos poupado de alguns tropeços básicos, mas nem por isso deixa de ser um ótimo entretenimento. Escrachado, absurdo e divertido, retoma um gênero de comédia despretensiosa que há tempos estava fazendo falta no cinema nacional, onde os filmes “cabeça” vinham dando o tom. Mais do que um filme bem-humorado, um filme realmente hilário!

 

Por Felipe Brandão.

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